25 de Abril : O reverso das medalhas (I)


As condecorações em Portugal, estão à data fixadas ao preço “da uva mijona”, cuja banalização da sua atribuição é tão deprimente, que já não se fixa em valores morais e honoríficos, mas sim em vulgares compadrios e ocultação de incompetências. Em suma: deixou de ser um ato simbólico e nobre e transformou-se numa rematada hipocrisia. Assim aconteceu com a recente condecoração dos “gloriosos” capitães de Abril, como se tivessem executado uma audaz e feroz batalha, para libertar este país dos horrores de uma brutal ditadura, que nem deu sequer um tiro para se defender, deixando transparecer que também ela queria ser libertada.
Esse histórico acontecimento apanhou-me integrado na infantaria das forças armadas portuguesas com incorporação em Angola e já com 27 meses no ativo. Estava então deslocado na zona operacional de Malanje donde se controlavam os avanços da guerrilha, num vastíssimo território, que começava a oeste, imediatamente a seguir à Vila do Lucala e se estendia a leste até ao Rio Cuango: fronteira com a República do Zaire e com as Lundas.
A guerrilha estava tão depauperada, que durante os vinte e quatro meses que ali estive deslocado, e nas inúmeras operações em participei, muitas delas mesmo junto à fronteira do Zaire, onde se albergavam as bases da FNLA, nunca estive perante a contingência de usar a arma, para defender fosse quem fosse, ou vislumbrei um guerrilheiro sequer. Claro, que o meu grupo de combate teve a lamentar uma baixa, mas não em combate. Foi num domingo à tarde que aconteceu esse infortúnio ao pobre rapaz, angolano: depois de ter bebido umas cervejas a mais, num bar da cidade, saiu para a rua um pouco descontrolado, e decerto sem saber como, foi contra um camião que passava naquele momento e… Nada houve a fazer. Coitado do Meinardo… Era um bom rapaz e um excelente 1º cabo.
Era assim a guerra em Angola no início do ano de 1974, e não faço comentários acerca das outras ex-colónias, porque não conhecia a realidade delas. Sobre Angola posso garantir, que o ténue espectro da guerra era tão débil, que não impedia ninguém de sonhar que aquele país iria ser uma potência económica a curto prazo, onde os naturais e os residentes conviviam irmãmente, com os mesmos direitos e os mesmos deveres, contrariando o que se falava e ainda hoje se fala, nesta pequena pátria sem norte e muito pouca lucidez.
Angola, e ao arrepio do que foi dito e se diz, era antes de mais isto:
Continua na próxima edição.